O Pesadelo da Arte Adamastor
"Em
terra de cegos quem tem olho é Rei", diz o povo com eterna razão.
Joana,
Joana Vasconcelos, de seu nome.
. A
sua profissão? – Artista plástica.
. A
sua arte? – Desproporção.
. O
seu contexto? – Portugal.
O
mesmo contexto social e humano que alegadamente cuspiu e agrediu o mesmo Amadeo
de Souza Cardoso que agora é canonizado em praça pública, por um povo
que continua a não entender grande coisa de artes visuais ou de história das
artes visuais. Mas adiante.
Passou-se
um século – mas aparentemente não se passou mais nada. A política lava a sua
alma também nestes pequenos espectáculos, organizando desfiles perante o óbvio
– genialidade de Souza Cardoso ou Almada – com o à vontade de um chefe de
circo:
"- Vejam, apreciem e vão para casa um pouco mais mansos. Amanhã há mais" (trabalho).
Entre
Joana e Amadeo, um mundo de diferenças: no caso dele, não basta existir em rosto de gente e depois sentir o choque físico de peças monumentais, que fazem o
resto; não, nada disso.
Klee
costumava dizer que “Desenhar é levar uma linha para passear”; já Joana
esqueceu-se da linha, deixou-a num parque público ao cuidado de um aspirador-
robot, e o resto é história – ou são estórias..?
Klee
é provavelmente o artista que mais peças pequenas, quase minúsculas, fez ao
longo de uma vida poética, de um longo e produtivo percurso na arte.
Inventou
mil e uma técnicas; usou imensos novos materiais, fez inúmeras experiências e
criou tantas combinações formais e cromáticas que custa a crer que uma tão
gigantesca criatividade tenha nascido de um só ser humano.
O
seu problema?
-
Não o fez a uma escala tal que outros seres humanos pudessem ser literalmente esmagados por esses
pequenos milagres da arte que tão pacientemente criou.
Já
Joana fez as apostas certas:
. O
cavalo certo – arte contemporânea (e não a arte moderna);
. A
estrutura certa – equipa de dezenas de pessoas a fazer o que ela apenas pensa (uma ideia que é característica de uma certa arte contemporânea);
. e,
finalmente, na dimensão certa – obras tão grandes que não cabem numa normal
galeria de arte – abrindo assim caminho para o investimento público (e
político) em obras que muitos acusam ser de regime (sem contudo o conseguir provar inequivocamente).
E,
no entanto, muita coisa há a apreciar em Joana Gulliver, perdão – Vasconcelos:
.
Uma interpretação correcta dos ensinamentos de Duchamp;
.
Uma ironia que, apesar da dimensão, consegue ser discreta e eficaz;
.
Uma interpretação sociológica que faz sentido;
. Um
reavivar da memória dos mais esquecidos, no que às indústrias portuguesas
(têxteis e não só) diz respeito.
Tantos
aspectos positivos, que são traídos (e não engrandecidos) por uma dimensão espacial que, ao invés de seduzir, se impõe. E não se impõe pela beleza visual ou significado artístico revolucionário,
antes pela diferença de proporção entre um ser humano e peças de um tamanho tão
monumental que ninguém as pode ignorar.
Ou
seja, arte(s) visuais no seu pior.
Eu
continuo a preferir uma outra monumentalidade: a da sensibilidade artística.
E,
essa, encontro-a nas pequenas aguarelas de Klee, ou Vieira da Silva, ou
Kandinsky; não em peças de Arte- Adamastor, sejam elas de Joana Vasconcelos, Jeff Koons, Christo, Richard Serra e muitos, muitos outros.
Termino
com um outro ditado popular: Quem não quer ser lobo não lhe vista a pele…
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